quinta-feira, 30 de junho de 2011

Quando termina a vida familiar?


A família equivale para o desenvolvimento da criança ao útero com relação ao embrião: numa certa altura do desenvolvimento, a criança deve ser expelida da família como o feto é expelido do útero.

                   Antes de existir escolas (já houve tempo em que não existiam escolas!), ninguém punha em dúvida que crianças deviam ser educadas pela tribo e, posteriormente, pela família...Agora se discute se é a família ou é a escola quem deve educar...A família é o arquétipo atávico de educação. Durante milênios, não houve outro meio para educar. E, apesar de não existirem escolas, a humanidade não se degenerou. Progrediu sempre até produzir os luminares que hoje negam à família o direito de educar. Fosse qual fosse a organização social, um filho foi sempre o produto da união de um homem e uma mulher, quer isso se chame família ou não. Sem o apoio inicial deste casal, nenhuma criança consegue sobreviver. Quando termina esta fase? Eis o problema.
                    O homem é extremamente desprotegido quando nasce. Não sobrevive sem proteção. Desse modelo inicial e básico, a escola só se tem afastado através do tempo. Até os extremados defensores da família como unidade básica e absoluta de educação fazem da escola autêntica antagonista dos processos naturais de educação usados, tradicionalmente, pela família. Até sete anos – anos decisivos para a educação – a criança não tem outro meio para se educar, salvo em países onde se propagaram jardins de infância, escolas-maternais e creches, coisas de que estamos bem distantes ainda. Se a natureza nos deu um modelo que provou, através do tempo, sua eficiência, porque havemos de construir nós uma contrafação de família para educar? A família é órgão heterogêneo, constituído por um homem e uma mulher, logo mais cercados por crianças de ambos os sexos, de idades diferentes, vivendo uma vida autônoma , embora profundamente mergulhada no meio social. Serve de pára-choque entre o meio social e as crianças, enquanto estas amadurecem e se preparam para serem incorporadas à sociedade adulta. Poderia ser reproduzido na escola este modelo atávico? Se a família não é um núcleo neurotizante, é um início de aprendizagem.
                      A aprendizagem ali é espontânea. Cada um ensina o que sabe e torna comum sua experiência. As valências são profundamente diferenciadas, dada a natureza heterogênea do grupo, as diferenças de idade e de sexo. Não há, na família, o que se chama, na escola, ‘’programa’’. A vida entra de portas adentro com toda a sua autenticidade, em cada momento, produzindo em face do mundo adulto, mas sofre suas próprias convulsões internas, também forma necessária de aprendizagem. O pai dá segurança em face do meio. A mãe, o equilíbrio emocional interno, fazendo a justiça miúda que se diferencia de acordo com as idades e as aptidões. Os mais velhos ajudam os mais moços e poupam aos pais novos esforços. Todos se julgam iguais, mas reconhecem a superioridade dos mais experientes. Existe intensa circulação psicológica dentro do grupo e a solidariedade é intensa. Os mais velhos aceitam a sobrecarga que escapa dos mais moços. A divisão do trabalho é aceita como fatal. Que há de parecido entre isto e uma escola?
                       Quando a partir de sete anos, a criança descobre que a família não pode dar todo o clima de que necessita para uma maturação, ‘’abandona-a’’, paulatinamente, e vai crescendo para a comunidade. Mas entre uma e outra existe essa fase de transição que se inicia pelo bando (de crianças), prossegue no grupo (de adolescentes) para terminar na equipe (de jovens). Ora, a escola recebe o jovem, justamente, nessa fase ‘’grupal’’, de modo que para favorecer a maturação nada mais deve fazer que aceitar a forma natural do crescimento humano. Por outro lado, nesta altura, a família deve começar a renunciar ao controle que até então vinha exercendo sobre a criança, deixando que respire livremente, como quando o feto completou nove meses de gestação: é hora da ‘’graça social’’, terminou praticamente a função da família, iniciando-se a vida de comunidade. O trágico para o jovem é que a família nunca admite que terminou sua função. Não devia o feto nascer...


Conflitos no Lar e na Escola
Editora: ZAHAR

Gulliver na praia de Lilliput



Cada geração – sendo nova etapa evolutiva da humanidade – deve ser estimulada a fazer novas regras, livrando-se das antigas: só as aranhas repetem, milênio após milênio, a mesma regra (teia) de viver...O futuro pertence aos jovens.

            Tomemos aquele indivíduo que vai ali passando na rua. Parece um homem só. Faz parte da multidão. Percebe-se, contudo, que não tem afinidades com ela. Junta-se ao aglomerado que olha no alto o satélite americano, mas logo segue caminho, sem deixar marcas nos companheiros que ficam contemplando o céu. Nada mais solitário que um homem que caminha sozinho...
             Tudo engano. Aproximemo-nos dele. É simples elo donde partem e onde vêm terminar inúmeras cadeias: está amarrado pela família, pelos irmãos, pelos parentes. Muito do que faz é provar ao pai que não é o vagabundo que ele julga. Admira o tio e quer imitá-lo. Já tem esposa e filhos que limitam e orientam sua conduta. O emprego (de que não gosta) decorre de suas responsabilidades familiares. Odeia o chefe, inconscientemente, e inveja o companheiro que progride sem esforço. Usa o emblema do clube para sentir-se sócio de outros, para não ser tão só. O talhe de sua roupa tirou-o de figurino francês que garantia aumento de ‘’personalidade’’ a quem a usasse. Freqüenta a roda de amigos de escola e procura dar satisfação aos que perguntam como vai. Parece Gulliver amarrado na praia de Lilliput por milhares de fios invisíveis...
             Se ele fizesse o mapa de suas ‘’ligações’’, dos fios que o prendem ao próximo, veria quanta dependência existe em sua pretensa liberdade. A sociedade com todos os seus grupos pesa sobre seus ombros, impedindo que seja o que deseja, realmente, lá no fundo do coração. Foi levado pela vida como a casca de noz pela corrente... Um dia resolve fazer uma excursão sozinho para ver se se livra do constrangimento dos outros. Mas, leva consigo seu ‘’aquário’’: o grupo está agora em seu interior.
               Disseram-lhe, desde criança, que ele era só. Que podia fazer da vida o que bem quisesse. Contudo, percebe agora que para dar um passo tem que primeiro remover montanhas. Tem de converter meio-mundo para poder expressar uma idéia sem ser linchado pela multidão enfurecida.
             E não foi treinado para viver assim dependente. Para viver em grupo. Toda sua educação baseou-se em suas forças individuais. Em sua ‘’vontade poderosa’’. Em sua autodeterminação. Sente o grupo não como libertação, mas como pesada carga que o esmaga e lhe tira a liberdade. A culpa foi dos pais e dos educadores que o educaram para o individualismo, para não reconhecer um fato básico da natureza humana: o homem é um animal social. Precisa do grupo para realizar-se, como precisa de oxigênio para não morrer asfixiado. Daí pedir-se a organização da vida escolar na base de clubes, de associações, de equipes de estudo, de discussão em grupo. A classe não é aglomerado heterogêneo de adolescentes, cujo ponto de convergência único e inapelável seja o professor na cátedra. A classe tem (quer queira ou não o educador) sua vida grupal. Em vez de lutar contra isso, deve-se aproveitar a organização natural determinada pela via e trabalhar com ela. Professor não é rei do terreiro, mas o orientador que caminha, de grupo em grupo, procurando ajudar e dinamizar a atividade nascente e espontânea. Cada aluno é um elo de uma complexa corrente de relações.
        A aprendizagem fundamental é aprender a influenciar no grupo e a não ser, apenas, uma vítima de pressão social: aprender a ser autônomo junto aos demais. Aprender a estabelecer regras de convivência.
        Numa escola assim, aprenderia o jovem a ser irmão de todos e participante de grupos: os liames que o aproximam das demais pessoas não lhe pareceriam cadeias, mas canais por onde passa, de um para o outro, o amor de que se faz a felicidade. Em vez de contorcer-se em fúria para quebrar as amarras, veria nelas sua completação natural e a fonte de seu enriquecimento espiritual. O cristianismo tem no amor ao próximo o seu grande mandamento: mandatum novum do vobis. Contudo – mesmo nas escolas cristãs – cultiva-se o individualismo e a competição desenfreada, fazendo-se uma pedagogia de acordo com o modelo capitalista de ‘’livre concorrência’’ e da superação do adversário. De nada vale a ‘’pedagogia do amor’’ a que se referem os tratados, se a estrutura escolar se baseia na competição. O amor exige também aprendizado. Não são as exortações que levam o homem à solidariedade. É no íntimo convívio do grupo que descobre-se o ‘’próximo’’. Educar-se não é aprender a obedecer as regras pré-fabricadas: educar-se é aprender a fazer regras cooperativamente.

Conflitos no Lar e na Escola – Teoria e prática da dinâmica de grupo segundo Piaget.
Editora: ZAHAR

O Blog do Professor Lauro - uma necessidade

Material comemorativo dos 90 anos do Prof. Lauro de Oliveira Lima

Esse é o blog do Professor Lauro de Oliveira Lima (meu pai). Formamos uma força-tarefa para criar esse espaço dedicado a sua vida e obra, até porque são muitos os pedidos de contato com ele e naturalmente é preciso atender a essa demanda de maneira produtiva e organizada. Esse trabalho é a base de informações que estamos trabalhando para produzir o Portal Lauro de Oliveira Lima, que será lançado nesse ano de 2011, quando ele completou 90 anos de vida, 70 dos quais dedicados integralmente a Educação em nosso país. Estamos solicitando de órgãos oficiais do Rio de Janeiro o apoio e recursos necessários para a produção do Portal.
Papai vai estar atento a tudo o que será postado aqui e, quando possível, irá responder as perguntas que forem feitas diretamente a ele. Eu, Beta, estarei também à disposição para responder questões relativas à sua obra.

Ana Elisabeth Santos de Oliveira Lima (Beta)
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