terça-feira, 30 de junho de 2015

MODERNIZAÇÃO DAS ARTES TRADICIONAIS 1º parte

Livro: Para que servem as escolas
Autor: Lauro de Oliveira Lima
Editora Vozes
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MODERNIZAÇÃO DAS ARTES TRADICIONAIS

1º parte

            A humanidade elaborou, ao longo das eras, uma série de “artes (técnicas) correspondentes a suas necessidades básicas: a arte culinária, a agricultura, a cerâmica, a pecuária, a tecelagem, a arquitetura, a engenharia, a puericultura, a medicina … e a educação. Grande parte da evolução civilizatória (cultura) baseia-se na simples substituição progressiva de modelos de ação empírica por modelos tecnológicos baseados na pesquisa científica (influência da racionalidade no comportamento prático). A modernização consiste, pois, em dar bases científicas a essas atividades e em inventar novas técnicas que tornem mais eficiente, eficaz e econômico o processo de produção. Tem sido espetacularmente drástica e acelerada as mudanças ocorridas, nos últimos séculos, nessas velhas “artes”. A invenção do tear, por exemplo, produziu, quase sozinha, a “revolução industrial” (processos mecânicos de tecelagem). O mesmo vem acontecendo, por exemplo, na agricultura, na pecuária, na arquitetura. Mas onde a ciência e a tecnologia subverteram profundamente uma “arte tradicional” foi na medicina (a expectativa de sobrevivência passou de 27 anos, em Roma, para quase 80 anos, hoje, nos Estados Unidos. A medicina transformou-se em “engenharia genética”, manipulando o próprio núcleo da vida através da “biologia molecular”. O médico (função exercida até pelos barbeiros, que funcionavam como cirurgiões) precisa, hoje, ser cientista (no mínimo os cientistas formulam as técnicas que o médico comum aplica, por vezes sem entender muito o que irá ocorrer no organismo). Fatos parecidos podem ser encontrados na evolução de quase todas as “artes tradicionais”, até mesmo na “arte culinária”. Menos em educação! A pedagogia, a puericultura, a didática, o processo escolar e a metodologia não se diferenciam, hoje, dos modelos usados na “iniciação tribal” (pré-história), em Roma, em Esparta, na Idade Média, antes da Revolução Francesa. Pelo contrário: o “fracasso escolar” (histórico e universal) parece aumentar com o correr do tempo (reprovação, evasão, baixo rendimento, perda de conhecimento, fraude, etc.). A pesquisa científica (psicologia, biologia, genética, epistemologia genética, neurologia, etc.) não influi na tecnologia educacional. O professor, agente da educação, comporta-se, hoje, como um simplório artesão tradicional, repetindo habilidades imemoriais. Se Aristóteles (450 aC) voltasse ao mundo, verificaria que os professores repetem, ainda, o seu modelo (peripatético) de dar aula, em meio a parafernália de um universo dominado pela sofisticada tecnologia. Isso na melhor das hipóteses, pois um grupo de  iniciados (conhecimentos infusos) propõe agora as mais pitorescas atividades , a título de “educação”: espontaneísmo, escola selvagem, ortofrenia, psicanálise, logopedia, educação artística, educação popular, pedagogia do amor, etc., abandonando totalmente as tentativas tradicionais de ensinar (conteúdo) e de treinar (habilidades), de tal modo que, alarmado, um grupo de educadores simplesmente prega a “volta à pedagogia antiga”, pelo menos como estratégia  (curvatura da vara) de retomada do bom senso (a finalidade indiscutível da escola é ensinar). Pulamos dos processos empíricos tradicionais para as fantasias modernas procedentes do pensamento mágico (o despertar dos mágicos). Não é de se admirar. Na medicina também existem regressionistas, apesar de alguns deles usarem “marca-passo”, drogas para desobstruir as coronárias, pontes de safena, muitos já macróbios, com imensa dívida para com a medicina moderna, não havendo meios de convence-los das sandices das soluções mágicas que propõem, o que equivale ao curandeirismo atávico (recentemente, um cientista patrício submeteu-se, em público, à pajelança praticada por dois feiticeiros indígenas). Por que o processo educacional não se moderniza, indo buscar na ciência e na tecnologia, os instrumentos de eficiência e eficácia? Por que o “fracasso escolar” aumenta em vez de diminuir, ao contrário do que ocorre em todas as demais “artes tradicionais”? Por hipótese (somente por hipótese), o magistério (os agentes da educação) deveria dominar as mais recentes e complexas conquistas científicas e tecnológicas da humanidade, para transmiti-las às novas gerações, como se fazia na pré-história, através da “iniciação tribal” (a educação continua a ser uma “iniciação tribal”) - pelo menos é a tarefa que a sociedade atribui ao magistério: ensinar conteúdos. O professor deveria ser o transmissor das melhores conquistas da “tribo”, como foi na pré-história! Contudo, cotejando-se esse grupo profissional com os demais (médicos, agrônomos, nutricionistas, engenheiros, etc.), verifica-se que é o grupo menos informado sobre a pesquisa científica, sobretudo a pesquisa referente a sua área profissional (psicologia, biologia, genética, história do conhecimento científico, epistemologia genética, etc.). Ainda hoje (problema que vem da Grécia e da Roma Antiga) não se sabe como alfabetizar uma criança. Existem centenas de métodos conflitantes, mantendo-se o fracasso escolar no mesmo nível histórico...

(Continuará...)

terça-feira, 16 de junho de 2015

O Desenvolvimento da Inteligência Tende para uma Estruturação Lógico-Matemática (3º parte)


(3a. parte)
Livro: Piaget para Principiantes.
Editora: SUMUS Editorial

O Desenvolvimento da Inteligência Tende para uma Estruturação Lógico-Matemática (págs. 51 e 52) (3º parte)

... J. Piaget, concordando com Kantor, afirma que, mais que as noções de “conjunto” devem ser ensinadas (desenvolvidas), nas crianças as intuições topológicas de onde derivam, geneticamente (reconstrução da arquitetura da matemática), as “intuições geométricas” (das geometrias projetivas e euclidiana), com a agravante de estes mecanismos estarem estreitamente, ligados à “construção do real” (representação do mundo) onde procedem os processos semióticos (dentre os quais a linguagem é o mais relevante). Tradicionalmente, a matemática inicia-se por operações elementares como número e medida (a ponto de os matemáticos suporem que estas noções eram formas a priori ou intuições básicas). Ora, não se pode operar sobre algo que não existe ainda, mentalmente: sem a combinação das noções de classe, série e correspondência não existe o número (salvo como uma palavra sem sentido) e sem as noções de contínuo, partição e deslocamento não existe a medida. Jean Piaget demonstra, por exemplo, que a noção de conservação (entre outras) deriva do grupo dos deslocamentos e que a conservação é a noção mínima para se poder contar e medir... Quando a criança domina, operativamente, as noções de número e medida, está a ponto de alcançar as operações abstratas que predominam nos processos matemáticos.

         O grande problema, portanto, é a pré-história da matemática. É difícil discutir-se com um matemático este problema, pois as noções pré-históricas da matemática não aparecem nos tratados elementares de matemática (e os matemáticos não se dão ao trabalho de estudar, por exemplo, a “gênese do número”). J. Piaget dedica dois volumes de quinhentas páginas cada um para descrever a embriologia das “intuições geométricas”, mostrando como das “homeomorfias” topológicas nascem as noções projetivas e a métrica euclidiana (o que corresponde, de maneira notável, às explicações teóricas da construção das geometrias). O grande trabalho do pedagogo, pois, não é descobrir uma “didática da matemática” (e a didática da matemática é o próprio método hipotético-dedutivo), mas planejar atividades didáticas que contribuam para a tomada de consciência de “embriologia das noções elementares da matemática” (atividade que ocupará um período de nove anos na vida da criança). A teoria de J. Piaget caracteriza-se pelo construtivismo (que por sinal é a forma de inventar a matemática), de modo que, a partir das atividades sensório-motoras, o pedagogo tem que encontrar processos didáticos que levam à construção das “noções elementares” da matemática. Quase nada se pode obter para isto dos matemáticos que partem de “intuições” que só aparecem no final deste longo período. O mesmo se pode dizer dos lógicos (os lógicos, também, não se dão ao trabalho de estudar a embriologia das noções elementares da lógica). O pedagogo, pois, tem que aprender um mínimo de matemática (teórica) para conduzir o desenvolvimento das crianças até o limiar das noções elementares usadas pelos matemáticos...

sábado, 6 de junho de 2015

O Desenvolvimento da Inteligência Tende para uma Estruturação Lógico-Matemática (2º parte)

(2º parte)
Livro: Piaget para Principiantes.
Editora: SUMUS Editorial

O Desenvolvimento da Inteligência Tende para uma Estruturação Lógico-Matemática (págs. 50 e 51)
(2º parte)
... A matemática hipotético-dedutiva (abstrata) dos matemáticos, portanto, é antecedida: a) de dois anos de atividades sensório-motoras (encaixes, ordenações e correspondências concluídas com a síntese do grupo dos deslocamentos); b) de cinco anos  de construções mentais (função semiótica) de alinhamentos (ordenações),  classificação (arranjos figurais), correspondências e cópia de modelos (concluídas com a síntese das noções de função e de identidade); c) de quatro anos de construção dos chamados “entes” matemáticos gerados pelas noções de seriação, classificação, partição (noções de número e deslocamento, medida, matrizes multiplicativas, quantificações de inclusões e de grandezas e conservações fundamentais).
         Existe, portanto, do ponto de vista pedagógico, uma pré-matemática (de fato, uma lógica elementar) correspondente: a) ao período sensório-motor; b) ao período simbólico; e c) ao período das operações concretas (agrupamentos de seriação, classificação, simetria, substituição, tábua de dupla entrada e árvore genealógica). Só após dominar estes elementos   infra estruturais, pode a matemática hipotético-dedutiva (a matemática é definida como uma ciência hipotético-dedutiva) ser apresentada à criança nas vésperas de sua entrada na adolescência. A chamada matemática intuitiva, de fato consta de longa elaboração operativa de coordenações de atividades e de estruturas elementares (estruturas de rede, de grupo, e estruturas topológicas). Em todos os chamados “entes” matemáticos (número, medida, constância, linhas, contínuo, etc.) estão latentes combinações de três estruturas-mães que são comuns à matemática e à inteligência em geral: a) estruturas algébricas (cujo modelo são os diversos tipos de grupos); b) estruturas de ordem (cujo modelo são as redes, lattices ou malhas) e c) as estruturas topológicas finitas elementares (cujos modelos são as vizinhanças, fronteiras, contínuo, donde surgem as chamadas “intuições geométricas”, isto, tanto no desenvolvimento da criança, como na reconstrução teórica das matemáticas modernas, segundo os Bourbaki).
         Para orientar uma proposta “curricular” destinada ao pré-primário (de dois a onze/doze anos) pode o pedagogo tomar como ponto de referência estas estruturas e suas combinações, de modo que possa ter certeza de que a criança construiu mentalmente (depois de construir sensório-motoramente), a estrutura de que se vai servir a matemática dos tratados elementares destinados às crianças. Ora, depois de dominadas estas       pré-noções matemáticas, a criança está habilitada a enfrentar com êxito os processos hipotéticos dedutivos da matemática, de modo que os processos “pedagógicos” se tornam irrelevantes (o método hipotético-dedutivo já é a “pedagogia” da própria matemática).
         A grande novidade, portanto, em matéria de “didática da matemática”, é a descoberta de que as “noções elementares” da matemática não tem nada de “elementares” precisando de um longo período de construção que vai do nascimento da criança aos onze/doze anos. É mesmo provável que as dificuldades históricas no aprendizado da matemática decorram de se considerarem “intuitivas” noções que demandam longa elaboração operativa. Kantor sugeriu que as noções de “conjunto” deviam ser ensinadas às crianças por serem, geneticamente (reconstrução da arquitetura da matemática) noções elementares (como as noções de correspondência que aprecem muito cedo no desenvolvimento da criança) ...

(Continuará)
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