quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Introdução à Pedagogia - Capítulo 1 - 3a Parte

INTRODUÇÃO À PEDAGOGIA – 2° edição
Lauro de Oliveira Lima
Editora Brasiliense
Capítulo 1
3º parte
...A criança, pois, prossegue sua embriologia depois do nascimento, quer complementando o desenvolvimento dos órgãos e tecidos (como ocorre, sobretudo, com o sistema nervoso), quer imitando ou inventando modelos de comportamento (esquemas de assimilação). Assim, como não se pode “acelerar” a gestação uterina, não se pode “atropelar” a construção dos comportamentos, sobretudo por que os comportamentos se formam por diferenciação ou composição de comportamentos mais elementares, precisamente, como ocorreu na construção dos órgãos no útero (construção sequencial). Daí a paciência que é preciso ter-se para “educar” uma criança: temos de acompanhar seu próprio ritmo. A criança não está à disposição do educador para que ele dela faça o que quer (pedagogia, em grego, quer dizer, “conduzi-la”, se obedecermos a seus processos embriológicos). Não se pode ensinar qualquer coisa à criança de qualquer idade: cada “aprendizagem” depende do grau de desenvolvimento alcançado pela criança, fato que complica, enormemente, a escolha das situações que apresentamos às crianças como estímulo pedagógico. Como as crianças têm sofrido, através da história, por querermos que elas adquiram comportamentos incompatíveis com sua embriologia! ... E, mais trágico ainda: quantos comportamentos deixam de ser adquiridos porque não criamos situações adequadas para sua construção, no momento apropriado da gestação (cada comportamento tem sua época própria para formar-se, ao longo do desenvolvimento, momento que, perdido, jamais voltará a apresentar-se)! Durante milênios, a educação das crianças foi totalmente aleatória. Só recentemente (Piaget), começou-se a entender a embriologia do ser humano, tornando-se a educação um processo científico.
Em síntese, todos os seres vivos são sistemas abertos cuja sobrevivência depende do meio. Para assimilar o meio, os organismos usam o comportamento (instintivo, habitual ou inteligente). No caso particular do ser humano, o comportamento nunca é instintivo (salvo algumas “montagens hereditárias” denominadas reflexos): ou é um automatismo resultante da imitação e/ou repetição ou uma estratégia inventada. Para adquirir novos comportamentos (hábito ou estratégia inteligente), o organismo parte sempre de comportamentos anteriores, de tal modo que todo novo comportamento é uma modificação de comportamentos já existentes. A construção de novos comportamentos ocorre ao longo da assimilação da realidade: quando os esquemas são insuficientes para assimilar a realidade, o organismo (mente) vê-se forçado a estruturar esquemas mais complexos e diversificados (acomodação). Só surgem novos comportamentos quando o organismo (mente) está em atividade assimiladora. São os obstáculos encontrados pela assimilação que possibilitam a construção de novos esquemas. O próprio organismo – por determinação do código genético – cria as dificuldades (problemas) para resolver, na busca de assimilar a realidade toda (a realidade é permanente obstáculo para a assimilação). O desenvolvimento do ser humano só se conclui com a “abertura para todos os possíveis” (abertura que está inserida, como possibilidade, em seu código genético). A pedagogia é um esforço técnico-científico de criar condições para que o ser humano realize, embriologicamente, todas as suas possibilidades. Para isto, o educador complexifica, progressiva e sequencialmente, as situações que a criança se veja forçada a criar comportamentos adaptativos, com o cuidado de adequar, qualitativa e quantitativamente, as situações ao momento embriológico (competência), o que implica a complexificação crescente destas situações (o nascimento é um exemplo de complexificação da situação em que o organismo vivia). Quando a complexidade alcança certo nível, o pedagogo, mesmo que deseje, não pode mais recorrer aos hábitos (inteligência curta), tendo de apelar para a inteligência (abertura para todos os possíveis). Depois de milênios de “educação pelos hábitos”, a humanidade descobriu que, desde a mais tenra idade, a criança pode ser “educada pela inteligência”, modelo de comportamento próprio de sua espécie. Mas, a mudança de processo não é tranquila: trava-se, neste momento, nas escolas, cruenta batalha entre a tradição milenar da exercitação e o novo modelo de educação criativa.


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