Livro: Piaget para Principiantes.
Editora: SUMUS Editorial
O Desenvolvimento da Inteligência Tende para uma
Estruturação Lógico-Matemática (págs.
49 e 50)
(1º
parte)
Num artigo
inserido em L’enseignement des
Mathématiques, T. I., Nouvelles
Perspectives, Delachaux et Nestlé, 1965, Jean Piaget lembra que as
estruturas-mães (Bourbaki) que os matemáticos consideram fundamentais,
primitivas e irredutíveis (hoje, os matemáticos encontram “estruturas” ainda
mais primitivas, como os morfismos, categorias, e funções, presentes, também,
no desenvolvimento das crianças) são também as estruturas básicas que iniciam o
desenvolvimento da inteligência das crianças, apresentando-se, nos dois
primeiros anos, como atividades ainda sensório-motoras. Deste modo, a matemática
pode ser apresentada como a sistematização (no plano hipotético-dedutivo) dos
processos operativos usados pela inteligência desde a mais terna idade da
criança, podendo-se dizer que, também a matemática, nos seus inícios não é
senão a “coordenação das ações” (juntar, separar, incluir, etc.).
Como a
inteligência é, fundamentalmente, um processo combinatório, é evidente que, desde os primeiros momentos desta
construção, as estruturas se combinam entre si, sem contudo, perder sua
identidade. Só agora os matemáticos estão compreendendo (reorganização) que
certas construções matemáticas, aparecidas historicamente, em primeiro lugar,
são de fato, muito anteriores, na ordem genética da construção (“o que é
primeiro na ordem da construção aparece por último na ordem de análise ou de
tomada de consciência”). Assim é que, só recentemente, os matemáticos admitiram
que as chamadas “intuições geométricas” (base das geometrias projetivas e
euclidianas) não são intuições nem muito menos “entes”, mas resultado de longa
e complexa construção a partir de “intuições” topológicas (vizinhança,
fechamento, fronteira, etc.). Ora, a topologia, como disciplina matemática, só
aparece, historicamente, recentemente.
Esta
descoberta é de importância excepcional para a pedagogia da matemática. Todo o
estudo de geometria, projetiva e euclidiana, desta forma, deixa de partir de
certas constâncias ou invariâncias
tidas como a priori (linha, contínuo,
distância, comprimento, correspondência, “intuições geométricas”, etc.) para
começar pelas “intuições” topológicas. A construção das chamadas “intuições
geométricas” exige um período de cerca de cinco anos no desenvolvimento da
criança, precisamente, o período que vai de dois a sete/oito anos, quando se
inicia o curso primário. Assim, a “matemática” do pré-primário (para não falar
da matemática do sensório-motor) é de fato uma pré-matemática ou uma lógica embrionária, donde a dificuldade de os
matemáticos (que acreditam nas “intuições” inclusive na do número: “Deus fez os
números inteiros: o resto todo é obra dos homens”, Kronecker) de sugerirem
atividades “matemáticas” para este longo e laborioso período do desenvolvimento
da criança. Mas, não é só. De sete/oito anos a onze/doze anos, a criança
constrói, lentamente, uma série de estruturas (classificação, seriação,
substituição, simetria, tábua de dupla entrada, árvore genealógica) que serão
indispensáveis para a aquisição das mais elementares noções da matemática (tudo
isto que os matemáticos supõem que as crianças possuem, intuitivamente, ou de
forma apriorística) ...
(Continuará)
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