domingo, 13 de outubro de 2013

PROFESSOR - ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA... - PARTE 3 (FINAL)

Livro: PEDAGOGIA: REPRODUÇÃO OU TRANSFORMAÇÃO
Lauro de Oliveira Lima Editora Brasiliense. Primeiros Voos Nº 9 /1982
PROFESSOR - ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA...
Terceira parte
A velha desculpa para o exercício desta guerra de opereta entre alunos e professores era que o mestre, sendo o guarda do conhecimento, da sabedoria, da perícia, precisava exercer a autoridade para transfundi-la na cabeça dos alunos, pois o enchedor de garrafas não pode trabalhar numa mesa que treme... Os velhos, nas civilizações antigas, eram respeitados (gerontocracia) precisamente por este motivo: precisamente não havendo escrita, tornavam-se os guardas da sabedoria, da experiência, da tradição, de tudo. É absolutamente idêntico o papel dos professores (gerontocratas)...  Mas esta desculpa já não vale: os conhecimentos, hoje, estão na bibliotecas, nos bancos de dados, nos satélites, na televisão, no cinema, nos gravadores, nos videocassetes. A humanidade descobriu, com a escrita, um meio para PRESERVAR a memória do grupo social sem depender dos velhos e dos professores. Os alunos, ao aprenderem a ler, deixam de precisar de recitadores (o lente medieval). Os computadores podem criar complexas situações de autoaprendizagem, dispensando, completamente, professores, reprodutores. Um armário de tapes de televisão substitui, hoje, por preço imensamente mais barato, toda a atividade do corpo docente com a vantagem (para os patrões) de tape não fazer greve... O professor-autoridade, o professor-conferencista, o professor-expositor ou explicador, o velho duce que nos legaram as civilizações clássicas e medieval... é uma “espécie em extinção”, como os dinossauros, diante da tecnologia moderna. Está nascendo uma nova espécie de professor...
A crítica a este fóssil sobrevivente dentro de uma civilização tecnológica vem de muito longe- Rousseau (1712) já dizia que “a mania pedantesca do mestre é sempre ensinar às crianças aquilo que elas aprenderiam melhor por si mesmas”. B. Shaw já captara com sua ferina ironia o erro fundamental da profissão magisterial: “se você ensina algo a alguém, ele não o saberá jamais”. Mais recentemente, os dois respeitados mestres da moderna epistemologia sentenciaram: a) G. Bachelard: descobrir é a única maneira ativa de conhecer: correlativamente, fazer descobrir é o único modelo de ensinar”. b) Jean Piaget: “tudo o que se ensina à criança impede que ela descubra ou invente”. Hans Aebli analisou, contundentemente, o método heurístico (chamado por uns “dialogal” que pretende substituir o velho discurso (exposição) do comandante ante as suas tropas ou de pregador perante seus fiéis (professar= proclamar, fazer confissão de fé). O método heurístico (dialogal) é intermitente (como o gorgolar da água que sai em golfadas da garrafa), fragmentário (atomiza a situação, o conhecimento, a teoria, em mil fragmentos deglutíveis, produzindo a perda de noção de conjunto) y sofístico (o condutor do diálogo- e Sócrates seu inventor era um sofista- pode dirigir a “discussão” para a conclusão que bem entender como se pode demonstrar através da técnica de “direção de conferências” que os norte-americanos ensinam aos executivos para dominarem as assembleias dos acionistas- ver Escola no futuro (de Lauro de Oliveira Lima. Ed. Vozes). Como se vê, nada resta como método expositivo (chamado na gíria escolar de “método da salivação” ou de “cuspe e giz”) ao moderno professor, consistindo o “método heurístico” ou “dialogal” um disfarce para salvar a figura do antigo pater famílias (o guia espiritual que, como o psicanalista moderno, termina ocupando, na mente do educando, o lugar da consciência). O que se busca, hoje, é “a morte do pai”, seja ele o tirano jupteriano ou o paciente guia espiritual que se transforma em guru “fazendo a cabeça” dos prosélitos. E sem pai para conduzir os indivíduos, só existe a “dinâmica de grupo” (grupo autônomo ou democracia).
O moderno professor (se não quiser ser eliminado pela televisão educativa, que leva, instantaneamente, o “discurso” a milhões de ouvintes, “discurso” que elimina todas as falhas), o moderno professor deve tornar-se mero animador que estimula atividade sensório-motora, verbal e mental dos alunos, propondo situações de complexidade crescente. Os verdadeiros educadores, já se vinham comportando assim em todos os tempos (mas como são raros verdadeiros educadores!). Em vez do diálogo entre mestre e aluno (situação fundamentalmente oblíqua e paternalista), o diálogo de todos com todos (democracia), o que se denomina discussão (ver Dinâmica de grupo no lar, na empresa e na escola- editora Vozes e Os mecanismos da liberdade, Editora Polis, ambos de Lauro de Oliveira Lima). O personagem moderno que mais se aproxima do modo como se deve comportar o professor atual é o técnico do time de futebol: orienta, dá instruções, corrige, estimula, mas não joga: “o professor não ensina: ajuda o aluno a aprender” (ver Escola Secundária Moderna, de Lauro de Oliveira Lima, editora Universitária). A microssociologia fornece, hoje, todos os elementos para fazer os alunos “jogarem”. Como se vê, voltamos às origens do sistema escolar: scholé (lazer) e ludus (jogo), pois o processo de desenvolvimento da criança só pode ser conduzido através de atividades livres, a partir das situações problemáticas que expandam o pensamento em todas as direções possíveis em busca de originalidade (“abertura para todos os possíveis”). O professor é como o agente catalítico cuja presença estimula e desafia as crianças que “jogam” (a discussão, mesmo em seus mais altos níveis, é um jogo). Nesta perspectiva, o ápice do êxito do professor é TORNER-SE DESNECESSÁRIO, suicídio profissional que só pode ser praticado pelos educadores que, em vez de fazerem da classe um palco para seu HAPPENING, fazem dela uma plataforma donde os jovens autônomos alçam voo para outras galáxias! ...
Há séculos os professores avaliam os alunos (metade do tempo dos cursos de formação de professores gira em torno do manejo desta arma mortífera sem a qual não haveria escola). Está na hora de os alunos avaliarem, também, os professores. Toda atividade que não sofre feedback (retroalimentação), incorporação corretora do efeito sobre a própria ação, auto regulação cibernética, tende a degenerar-se: a atividade do magistério é uma das poucas que não sofre censura, mesmo porque o fracasso é atribuído aos alunos (ver Escola Secundária Moderna, de Lauro de Oliveira Lima, editora Universitária). Se os professores recebessem o feedback de suas aulas (de sua atividade docente), disporiam de riquíssimo meio de auto aperfeiçoamento contínuo. Mas para isto é preciso primeiro renunciarem ao mandarinato e transformarem-se em técnicos de time... A moderna psicologia verificou que “quem acabou de aprender é quem está mais apto a ensinar”, isto porque ainda guarda a lembrança dos rodeios que foram que foram necessários para a aprendizagem (dinâmica de grupo). Os professores, pois, poderiam aprender de seus melhores alunos se não se fixassem na atitude de capatazes encarregados de fazer os operários trabalharem para o patrão...

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