segunda-feira, 18 de julho de 2011

Um bebê na universidade

Infância acelerada – Envelhecimento precoce – Onde querem chegar? – know-how ou estruturas de pensamento? – A ‘’corrida ao pau-de-sebo’’ – Diploma ou revólver?

Depois do bebê de proveta, os cientistas conseguirão, um dia, abreviar o tempo de gestação para trinta dias? Por mais incômoda que possa ser a gravidez, as mães, em geral, conformam-se com este indispensável prazo biológico, não havendo noticia de que tenham tentado de alguma forma, apressar o ciclo de desenvolvimento do embrião. O mesmo fazem os agricultores: esperam, pacientemente, que a semente germine e a planta cresça com seu próprio ritmo (o agricultor, necessariamente, tem que aprender a ter paciência, esperança e previsão). Quando o crescimento biológico perde seu ritmo natural, transforma-se em “câncer”, deformando o projeto contido no código genético. O pecuarista conhece o tempo necessário para a cria crescer e os momentos de separá-la da mãe, de engorda, de venda, de produção. Tudo ocorre tranquilamente, de acordo com o tempo determinado pelo crescimento biológico.

Os seres humanos tentam acelerar a infância e retardar a velhice, mas não conseguem modificar a rotação da Terra...

Com o ser humano, de maneira estranha, logo que a criança nasce, inicia-se violenta pressão para que supere, rapidamente, suas etapas de crescimento. Ora, os biologistas verificam que, quanto mais longa a infância de um animal, mais feito ele é como adulto. Quando perguntavam a Piaget se se podia “acelerar” o desenvolvimento das crianças, ele respondia, invariavelmente, que “isto é um problema de americanos”. Segundo ele, os americanos estão obsessivamente preocupados em acelerar o crescimento das crianças ao invés de ampliar, o mais possível, os estágios de desenvolvimento e criar amplas bases para as etapas seguintes. Como o desenvolvimento é uma complexa construção (interação entre o organismo e o meio), quanto mais tranqüilo processo, mais ricos serão os resultados das combinações que ocorrerão. Algo parecido com a revelação progressivo de uma chapa fotográfica tirada com a câmera Polaroid: é preciso dar tempo para que as combinações ocorram e ampliem sua funcionalidade com a interação com o meio. Cada nova estrutura deve ser amplamente experimentada pela criança.

Há tempo próprio, e removível, para falar, rastejar, andar e aprender a ler: violar este ritmo implica em distúrbios mentais.

Quem trabalha com crianças pequenas, em escolas maternais e em jardins de infância, conhece a “corrida ao pau-de-sebo”. Enquanto a criança não aprendeu a ler, os pais toleram que a escola experimente os mais diversos métodos e que siga as teorias mais modernas. Mas quando chega a idade tradicional de alfabetização (entre 6 e 7 anos) os pais perguntam se tudo aquilo (a pedagogia) não é apenas brincadeira e diversão. É que a alfabetização é o primeiro know-how contabilizável, isto é, com valor econômico, numa sociedade competitiva. De repente, ficam angustiados, vigiando se a criança aprendeu não a ler... Daí pra frente, o problema é fazer a criança entrar na corrida curricular, transpor rapidamente o primário, entrar no ginasial e, finalmente, o mais cedo possível, enfrentar o vestibular. Transposta esta barreira, cessa a angústia: o garoto está equipado para a luta pela vida. Ninguém pergunta se obedeceram aos ritmos de amadurecimento, se a escola realmente deu oportunidade à estruturação mental, se a criança foi feliz durante esse período de crescimento. Todas as deformações possíveis e aí estão as logopedistas para corrigi-las.
A universidade é um processo de reflexão só acessível a adultos plenamente maduros.
A alfabetização nada tem a ver com o desenvolvimento da criança, sendo apenas um know-how altamente valorizado no mercado da competição (aprendizagem de um código que exige certos amadurecimentos fisiológicos e psicológicos que jamais são verificados). A entrada no curso ginasial (5.ª a 8.ª séries do 1° Grau), por exemplo, exige o amadurecimento das estruturas lógico-abstratas, em o que toda aprendizagem transforma-se em mera justaposição, que logo é eliminada por falta de estruturas de assimilação. A entrada na universidade só deveria ser feita depois de, digamos, 21 anos, quando o jovem tivesse plena maturidade para manipular a complexidade dos processos científicos. O resultado é uma chusma de doutorezinhos imaturos e semi-letrados, sem o mínimo poder de reflexão, com a cabeça cheia de coisas decoradas. Mas, os pais estão felizes de lhes ter fornecido o diploma, espécie de tacape com que enfrentarão os adversários na ‘’luta por um lugar ao sol’’. O resultado é semelhante ao que se obtém amadurecendo frutas à força, por processos artificiais... E para onde vão todos nessa corrida? Perde-se o sentido de viver a vida em troca de subir rápido no ‘’pau-de-sebo’’.

Temas Piagetianos - Lauro de Oliveira Lima
Março, 1981

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...